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Barra da Tijuca: o sertão que virou a Miami brasileira
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Publicado em 13/11/2015
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Sim, embora o carioca da Avenida, do Posto 4, dos chás e cinemas chics fique espantado, existe, nesta sua maravilhosa terra, um "sertão", como na Amazônia, em Matto Grosso, em Goyaz, em Minas, na Bahia. Embora menos bravio...

(O Sertão Carioca, de Armando Magalhães Corrêa)

 

 Sertao carioca

Local de vida pacata, pouco habitado e com fauna e flora exuberantes. Assim era o “sertão carioca”, que correspondia à região da Barra da Tijuca que hoje também engloba os bairros de Jacarepaguá, Guaratiba e Recreio dos Bandeirantes, descrito por Armando Magalhães Corrêa, escritor, ilustrador e naturalista autodidata. O termo, usado por ele em crônicas publicadas na década de 1930, no jornal Correio da Manhã, deu nome ao livro que reúne uma série de artigos e gravuras sobre personagens, lugares e ofícios daquela região, em sua maioria já inexistentes.

Hoje, o naturalista minimamente ficaria surpreso com os rumos que tomou a localidade, com destaque para o bairro da Barra da Tijuca. Sistematicamente ocupada a partir da década de 1960, após a elaboração do plano do urbanista Lucio Costa e a realização de investimentos públicos para melhoria das condições de acesso à região, a Barra hoje é identificada por seus condomínios fechados, hipermercados, shopping centers gigantescos e largas avenidas. Essas são algumas das características do bairro semelhantes à cidade de Miami, nos Estados Unidos, o que leva a Barra a ser conhecida como a “Miami brasileira”.

O bairro preserva um extenso litoral propício para banho – frequentado por cariocas de diversas regiões – e importantes áreas naturais, como a Área de Proteção Ambiental do Parque Natural de Marapendi. Foi Magalhães Corrêa, inclusive, o primeiro a propor a criação de uma reserva biológica em Marapendi, que apenas em 1991 tornou-se Área de Proteção Ambiental.

 

O início da ocupação


ArruamentodeterrenosnaBarradaTijucaA dificuldade de acesso foi um dos motivos da lenta ocupação da Barra da Tijuca. Na época colonial, o povoamento começou por Jacarepaguá, por meio da antiga estrada dos beneditinos. O grupo religioso, durante mais de dois séculos, explorou e arrendou as terras herdadas de Dona Vitória, neta de Salvador Correia de Sá (sobrinho de Mem de Sá), que governou a cidade no final do século XVI.

Ao contrário dos bondes e trens, que promoveram a urbanização nas regiões mais antigas da cidade, foi a implantação de estradas que induziu o processo de ocupação da Barra da Tijuca – outro aspecto que a diferenciou das demais regiões da cidade. Ou seja, o meio de locomoção usado foi o rodoviário e não o ferroviário. Esse fato é evidenciado pelo grande número de estradas abertas ainda no século XIX, como a dos Bandeirantes, do Joá, de Furnas, das Canoas e da Gávea, entre outras.

A ocupação da região se deu, inicialmente, por dois acessos. No sentido Zona Sul, pela Estrada de Furnas e pela Avenida Niemeyer (1920). Historicamente, a Barra também esteve muito ligada à Zona Norte e à Tijuca – o que também foi decisivo para sua ocupação –, já que os moradores dos bairros dessas regiões preferiam ir às praias pouco frequentadas de lá. Isso pode ser explicado pelo investimento feito, até a década de 1960, em vias de acesso como a Estrada Grajaú-Jacarepaguá.

 

O plano de Lucio Costa e seus desdobramentos

Apesar de os loteamentos Jardim Oceânico e Tijucamar terem sido implantados em 1939, o boom de crescimento da Barra da Tijuca ocorreu apenas a partir do final dos anos 1960 e início dos anos 1970, época de intenso processo de especulação imobiliária. Diante desse crescimento, em 1969, o governador do Rio, Francisco Negrão de Lima, convidou o urbanista Lucio Costa – responsável pelo plano-piloto da cidade de Brasília – para elaborar o plano da Barra.

VistaaereadaBarradaTijucaLucio propôs uma urbanização racional e planejada, que abrangia uma área de 120 quilômetros quadrados – da baixada compreendida entre a Barra da Tijuca, o Pontal de Sernambetiba e Jacarepaguá –, trazendo um novo modelo urbano para a cidade, na tentativa de conter a ocupação caótica e desordenada já iniciada.

O plano partia da Rodovia BR-101, que virou a Avenida das Américas – o grande eixo que cruzava a região e não poderia ser alterado. A ideia do urbanista era que essa avenida se mantivesse como uma via expressa, sem sinais de trânsito e cruzamentos, com passagens de nível a cada quilômetro, para viabilizar os retornos dos carros e a travessia dos pedestres – o que não aconteceu.

O princípio básico era a nuclearização das zonas residenciais coletivas. A região também contaria com três centros urbanos principais: um junto ao Jardim Oceânico, outro em Sernambetiba e um terceiro equidistante desses dois, que seria o Centro Metropolitano – com opções de transporte para outros bairros e, principalmente, para o centro da cidade. Além de rodovias, o urbanista previra o metrô.

Ainda de acordo com o plano, a Avenida Litorânea (hoje, Sernambetiba) não teria mão dupla, canteiro central ou retorno. À beira-mar estariam prédios baixos – para não bloquear a visão do mar – e, mais para dentro, os edifícios maiores.

Na década de 1980, com a construção da Autoestrada Lagoa-Barra, a ocupação da região se intensificou – e de maneira desordenada. O plano elaborado por Lucio Costa sofreu, ao longo das décadas, uma série de alterações, que levaram o urbanista a abandonar a Sudebar – Superintendência de Desenvolvimento da Barra da Tijuca (antes, Grupo de Trabalho para a Baixada de Jacarepaguá), responsável pela aplicação do plano – e a evitar falar sobre o assunto. Em entrevistas, ele chegou a declarar que “não tinha lembrança de ter sido criador desse projeto”.

Em abril de 1981, um decreto consolidou as alterações no plano-piloto de Lucio Costa. As novas propostas alteraram o perfil da região, produzindo uma verticalização acentuada e uma diversificação do uso do espaço, principalmente na Avenida Sernambetiba.

 

Tentativa de emancipação e novo boom imobiliário

Em 1988, alegando que a Barra era o local da cidade com impostos mais altos e que recebia menos retorno, alguns moradores levantaram a bandeira separatista, defendendo que o local se tornasse um município. Por falta de quórum, a reivindicação não foi para frente.

PraianaBarradentroMesmo assim, no ano 2000, um projeto de lei determinou “providências objetivando a emancipação dos atuais bairros da Barra da Tijuca, São Conrado, Recreio dos Bandeirantes e Jacarepaguá, os quais constituirão um só município, com nome de Barra da Tijuca e sede no mesmo local”. Também sem sucesso.

As discussões sobre o tema eram deixadas de lado enquanto o bairro vivia um novo crescimento imobiliário ao longo da década de 1990, com o lançamento de prédios comerciais. Nesse mesmo período, a construção da Avenida Governador Carlos Lacerda, conhecida como Linha Amarela, melhorou as condições de acessibilidade e incentivou grandes empresas a se estabelecerem na Barra.

 

A segregação dos espaços

Em busca de status e exclusividade, a burguesia e a classe média alta escolheram o bairro e seus condomínios fechados, tidos como atraentes por oferecer conforto e segurança. Com o crescimento do local, aumentou a demanda por mão de obra, tanto na construção civil quanto no setor de serviços. Mas, embora o plano-piloto original previsse moradia para famílias da baixa classe média e de baixa renda (os “blocos econômicos”), isso não aconteceu.

Assim, notou-se um processo crescente de favelização nos arredores das lagoas e de outras áreas de risco existentes no bairro, e também em Jacarepaguá. Inicialmente, essas favelas abrigavam os trabalhadores dos empreendimentos imobiliários que estavam sendo construídos, mas tornaram-se local de moradia permanente para uma população que não parava de crescer. Um exemplo é a comunidade do Rio das Pedras, que teve expansão muito significativa.

 

Um novo estilo de vida

Hoje, os condomínios exclusivos do bairro tornaram-se uma “cidade dentro da cidade”, oferecendo comércio, opções de lazer e até mesmo sistema próprio de transporte, para diferentes pontos da cidade.

BarradaTijuca2012Na Barra, as ruas funcionam, prioritariamente, como canal de circulação, e menos como espaços de convivência e sociabilidade. Para sair dos condomínios, a opção é o automóvel, que pode levar a uma grande diversidade de restaurantes, shopping centers, casas noturnas, bares, cinemas e, claro, a praia. Para chegar ao mar, muitos condomínios também dispõem de um serviço de balsa, que encurta distâncias e evita o acúmulo de carros sem vagas para estacionar – sobretudo nos finais de semana ensolarados.

O status que o bairro confere e a consequente valorização, sobretudo imobiliária, explicam o fato de muitos empreendimentos atribuírem seus endereços à Barra ou mesmo incorporarem o nome do bairro.

Criada por meio de um decreto de 23 de julho de 1981, a Barra da Tijuca faz parte e dá nome à XXIV Região Administrativa da cidade, que inclui também os bairros de Camorim, Grumari, Itanhangá, Joá, Recreio dos Bandeirantes, Vargem Grande e Vargem Pequena, e tem tido um crescimento expressivo. Segundo o Instituto Pereira Passos (IPP), em 2020, a R.A. da Barra da Tijuca terá 507.520 habitantes.

Lá, se localiza a sede da 7ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), além de 15 escolas de Ensino Fundamental, uma creche e dois Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDI).

Em 2016, a Barra da Tijuca vai receber a maior parte das instalações dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos, onde serão realizadas competições de diversas modalidades esportivas. Após os Jogos, parte do Parque Olímpico vai se transformar no primeiro Centro Olímpico de Treinamento (COT) do país.

O bairro também vai abrigar a Vila Olímpica e Paralímpica – casa dos atletas durante as competições –, além do Centro Principal de Imprensa (MPC), o Centro Internacional de Transmissões (IBC) e a Vila de Mídia da Barra.

 

 

 

 

Fontes:

 

Notas Técnicas do Plano Estratégico (n. 2, 3 e 4). Rio Estudos, n. 94, fev. 2003.

LEITÃO, Geronimo; REZENDE, Vera. Planejamento e realização da Barra da Tijuca como espaço residencial, evolução e crítica de um projeto para uma área de expansão da cidade do Rio de Janeiro. Universidade Federal Fluminense – UFF/RJ.

FREITAS, Ricardo Ferreira; LESSA, Roberta. Para além das grades: a mídia e a violência nas fortalezas da Barra da Tijuca. Trabalho apresentado ao NP 21 – Comunicação e Culturas Urbanas, do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

MAIA, Rosemary Santos. A produção do espaço em áreas de autossegregação: o caso da Barra da Tijuca. Anuário do Instituto de Geociências/UFRJ, v. 21, 1998.

http://www.rio2016.com/

http://portalgeorio.rio.rj.gov.br

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