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Os indígenas e a construção do Rio de Janeiro
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Publicado em 22/10/2018
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Ilustração retirada do livro Os aldeamentos indígenas do Rio de Janeiro

O carioca deve boa parcela de sua identidade aos Tupinambá e Temiminó: eles ergueram fortalezas; construíram o Aqueduto da Carioca (atual Arcos da Lapa), trazendo água das nascentes nos altos dos morros para a cidade; abriram caminho até as Minas Gerais; nos legaram diversos saberes, como a habilidade de cultivar plantas comestíveis adequadas aos trópicos e nomes para designar localidades e o próprio homem.

Para resgatar essa memória, José Ribamar Bessa Freire, coordenador do Programa de Estudos dos Povos Indígenas, Pró-Índio, da Faculdade de Educação da Uerj, esteve à frente de uma equipe de 12 pessoas para vasculhar 25 arquivos da capital. O trabalho faz parte do Guia de fontes para a história indígena e do indigenismo em arquivos das capitais brasileiras, editado pela USP, e também publicado pela Uerj, em dois tomos, com o título Os índios em arquivos do Rio de Janeiro.

“Esse trabalho foi iniciativa de John Monteiro, historiador já falecido, e Manuela Carneiro da Cunha, antropóloga. Eles queriam combater a ideia de que não temos uma história indígena porque não existem documentos, já que a tradição indígena é oral. Os arquivos do Rio de Janeiro representaram 2/3 da obra porque o Rio foi capital do Brasil, então temos muitas instituições de âmbito nacional. Trata-se de material rico e vasto, muitas vezes malconservado, à espera de pesquisadores que se animem a destrinchá-lo”.

Bessa estuda a questão indígena há 40 anos e escreveu o livro paradidático Os aldeamentos indígenas do Rio de Janeiro em conjunto com Márcia Malheiro. Por meio dessa publicação, podemos conhecer muito de como viviam os povos indígenas que habitavam a região onde hoje se encontra a cidade do Rio.

Tupinambá e Temiminó

Em 1503, por exemplo, quando Gonçalo Coelho construiu a primeira feitoria para explorar pau-brasil no que é atualmente provavelmente a Praia do Flamengo, os Tupinambá ou Tamoio (os portugueses, às vezes, davam nomes distintos para a mesma tribo) habitavam as zonas de laguna e enseadas da região (desde Cabo Frio até Angra dos Reis); e os Temiminó ou Maracajá, situavam-se no que hoje é a Ilha do Governador e o fundo da Baía de Guanabara (palavra tupi que significa baía abrigada). Eram centenas e centenas de tabas, autônomas entre si, cada qual com seu cacique e uma população variando entre 500 e 3.000 indígenas.

Segundo depoimentos de missionários, eram povos alegres, apaixonados pela música e pela dança. Pintavam o corpo e enfeitavam-se com colares feitos de conchas marinhas e penas coloridas de aves. Tinham noções de astronomia e podiam prever as chuvas e as grandes marés, observando as estrelas, a lua e o sol. Conheciam as relações entre os seres vivos e o meio ambiente: os hábitos dos animais, a época de amadurecimento dos frutos e a propriedade medicinal dos vegetais. Realizavam experimentos genéticos com as plantas, selecionando sementes e testando hipóteses para melhorar as espécies. Cultivavam, em grandes roças comunitárias, mandioca, milho, abóbora, feijão, amendoim, tabaco, pimenta e muitas árvores frutíferas. Plantavam e teciam o algodão, com o qual faziam suas redes de dormir. Fabricavam cestas de cipó, panelas e vasos de barro, machados de pedra, facas de casca de tartaruga, agulhas de espinhas de peixe, e muitos instrumentos musicais de sopro e percussão.

Tupinambá, de Theodore de Bry

Com a chegada dos portugueses, tornaram-se a mão de obra que possibilitou a abertura de picadas e clareiras, a derrubada de árvores e seu transporte, a condução de canoas, a construção de feitorias, engenhos e fortalezas, o trabalho nas olarias, na agricultura e em diversas outras atividades de subsistência de todos que passaram a residir nessas terras, incluindo as roças, a fabricação de farinha, a caça e a pesca. Documentos oficiais referiam-se aos indígenas como negros ou gentios da terra.

Loteamento das terras indígenas

Na década de 1530, com a adoção do sistema de capitanias hereditárias, a Coroa Portuguesa dividiu as terras habitadas pelos indígenas do litoral em grandes lotes, repartindo-os entre portugueses cristãos. Os donatários podiam explorar as riquezas da capitania, fundar vilas, nomear ouvidores e tabeliães e arrecadar dízimos. Detinham a posse de 20% do total das terras, devendo o restante ser loteado e concedido a terceiros - homens de muita posse e família - sob o sistema de sesmarias. As Cartas de Doação concediam ainda aos donatários o privilégio de escravizar indígenas, permitindo-lhes "cativar gentios para seu serviço e de seus navios".

O recôncavo da Guanabara, onde floresciam dezenas de aldeias, foi rapidamente retalhado em sesmarias e começou a ser ocupado por engenhos desde meados do século XVI. Com a fundação da vila de São Sebastião do Rio de Janeiro, vastas sesmarias foram concedidas para a constituição do patrimônio da cidade, incluindo parte da Baía de Guanabara e adjacências. Para fora do núcleo urbano, estendia-se uma zona agrícola e pastoril, com lavouras, engenhos e campos de pastagem.

Escravidão

Os portugueses conseguiram impor aos indígenas um regime de trabalho regulamentado por uma legislação especial, nem sempre respeitada, que sofreu modificações ao longo de todo o período colonial. Este sistema de trabalho previa três formas de recrutamento, ou seja, três modos diferentes de retirar o indígena de sua aldeia de origem e levá-lo para a zona de ocupação europeia: a guerra justa, o resgate e o descimento. As duas primeiras formas transformavam o índio em escravo e a última o submetia a trabalho obrigatório.

A escravidão dos indígenas vigorou em toda a América portuguesa até 1755, quando foi oficialmente abolida no Pará e no Maranhão pela Lei de 6 de junho daquele ano, cujos dispositivos foram ampliados para todo o Brasil pelo Alvará de 8 de maio de 1758. Na segunda metade do século XVIII, o trabalho compulsório dos indígenas continuou, mas não mais sob a forma de escravidão. Esta só voltaria a existir legalmente, por um curto período de tempo, em pleno século XIX, com a chegada da família real ao Brasil. O Príncipe Regente, depois de fugir das tropas napoleônicas, decretou guerra ofensiva aos Botocudo, em Minas Gerais. Os indígenas presos nessa guerra foram distribuídos entre os oficiais e soldados da tropa, tornando-se escravos durante 15 anos. Essa legislação só começou a ser modificada a partir de 1831.

A presença de indígenas na Corte foi diminuindo progressivamente. No século XX, eles deixaram de figurar no mapa da cidade e do Estado do Rio de Janeiro e na documentação oficial. Todos os grupos indígenas que viviam na cidade do Rio de Janeiro foram extintos.

A violência que dizimou os indígenas não apagou sua herança cultural. Como escreveu o antropólogo Darcy Ribeiro, eles cultivavam em suas roças umas quarenta plantas que são até hoje o sustento básico do povo brasileiro.

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