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Pensando a Educação
Liberdade cognitiva e o papel da MultiRio
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Publicado por Maíra Moraes em 26/03/2025

Maria tem 13 anos. Ela é estudante de uma escola pública já nos anos finais do fundamental. Em uma roda de amigas, enquanto defendia o posicionamento de sua influenciadora favorita, interrompeu de repente sua linha de argumentos e soltou em tom de lamento: “ontem perdi minha mesada da semana na bet” e complementou “semana que vem vou ter que compensar”.

Miguel tem 10 anos. Ele é um excelente aluno que tem como principal fonte de entretenimento assistir vídeos pelo seu próprio celular. Ao abrir seu aplicativo de favorito, ele recebe recomendações baseadas não apenas em seus interesses, mas também em algoritmos projetados para maximizar seu tempo de permanência na plataforma e levá-lo a algum tipo de consumo.

Maria e Miguel são exemplos que representam outras milhares de crianças e adolescente nos dias de hoje. No tempo que permanecemos conectados, cada um de nós submerge em uma bolha de informação, muitas vezes sem perceber que nosso pensamento está sendo guiado por uma linha definida por códigos projetados por instituições.

Esses acontecimentos evidenciam a importância de se elaborar um conceito basilar para o futuro da educação e cuja temática tem atravessado, mesmo com outras denominações, a história da MultiRio: a liberdade cognitiva.

Tecnologia, Aprendizagem e Formação Crítica

Está na hora de reconhecer a liberdade cognitiva como um novo direito humano fundamental, uma cláusula pétrea da nossa Constituição. Pesquisadores do tema relacionam esse conceito às neurotecnologias e à influência de mídias digitais na construção do pensamento.

Em um mundo onde a manipulação da atividade cerebral é possível, a preservação da autonomia cognitiva deve ser incorporada às discussões sobre ética e legislação.

Estudos sobre liberdade cognitiva frequentemente abordam o impacto de substâncias psicoativas no funcionamento do cérebro. No entanto, é necessário ampliar essa análise para incluir a influência das redes sociais, dos jogos eletrônicos e dos algoritmos que, comprovadamente, nos levam a tendências de comportamentos e gostos.

Importante lembrar que o algoritmo do Brasil é diferente da França ou de qualquer outro país. Variáveis como legislação, cultura de consumo, restrições governamentais, publicidade e monetização, entre outras, mudam - e muito - a oferta de conteúdo entre um território e outro.

Há alguns meses, o TikTok anunciou que permitirá aos usuários na Europa desligarem seu algoritmo, possibilitando uma navegação mais autônoma dentro do aplicativo. Essa decisão representa um passo significativo para o exercício da liberdade cognitiva, pois permite, em um certo nível de autonomia, que as pessoas escolham o que desejam consumir, sem serem direcionadas por inteligências artificiais. Essas mudanças foram feitas para cumprir a Lei de Serviços Digitais da União Europeia (DSA).

Educação e Liberdade Cognitiva

O papel da educação voltada ao pensamento crítico torna-se ainda mais necessário. Torna-se ainda mais urgentes investimentos no desenvolvimento de estratégias pedagógicas que incentivem a criatividade e a autonomia intelectual dos estudantes. Algumas iniciativas necessárias incluem:

  • Educação midiática: Ensinar alunos a compreenderem o funcionamento dos algoritmos e a identificarem manipulações digitais.

  • Educação socioemocional: Compreender que relações de consumo e vida digital muitas vezes envolvem questões emocionais que impactam toda família.

  • Neurociência e aprendizagem: Integrar conhecimentos sobre como o cérebro aprende e como as tecnologias podem impactar o desenvolvimento cognitivo.

  • Uso racional da tecnologia: Promover o uso equilibrado das plataformas digitais, estimulando espaços de reflexão e interações mais humanas.

O uso excessivo de tecnologias e jogos não é apenas uma escolha individual, mas um problema social que afeta a saúde mental, as relações interpessoais e o desenvolvimento das novas gerações, exigindo um olhar crítico e soluções coletivas.

A liberdade cognitiva é um direito para a autonomia dos indivíduos e para a construção de uma sociedade mais crítica e reflexiva. É papel da educação garantir que estudantes desenvolvam a capacidade de pensar por si mesmos, reconhecendo influências externas que limitem sua capacidade de escolha e raciocínio.

O que somos hoje também é reflexo da tecnologia e da forma como ela nos apresenta o mundo.

O trabalho da MultiRio pela educação parte da crença de que podemos ser uma influência positivamente crítica, e não um fator de limitação cognitiva, no mundo das mídias e das tecnologias.

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Maíra Moraes é professora e pesquisadora com mais de 15 anos de experiência na criação, implementação, gestão e avaliação de tecnologia social para educação em governos, ONGs e organizações privadas, nacionais e internacionais. É doutora em Comunicação pela Universidade de Brasília (UnB), com pós-doutorado em Antropologia Social pela mesma instituição. Atualmente, é diretora-presidente da MultiRio.

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