Professores de Educação Física do Ensino Fundamental costumam se preocupar em desenvolver as habilidades motoras de seus alunos, mas Arthur Pires e seus colegas do Ciep Maestrina Chiquinha Gonzaga, 8ª CRE, em Bangu, buscam também “trazer um pouco do mundo para a sala de aula”.
Formado pela UFRJ, Arthur é sócio do pai (que o inspirou a seguir a profissão) em uma academia de ginástica em Campo Grande, e, desde 2011, é professor concursado da Rede Municipal de Educação.
Era recém-formado quando começou a lecionar no Ciep, e reparou que as crianças, em geral, tinham sua vida restrita às redondezas da escola e da casa – vidas permeadas, muitas vezes, pela violência dos tiroteios na Favela do Taquaral e, ao mesmo tempo, com um cotidiano quase rural. Essa realidade fez com que ele e os outros professores de Educação Física da unidade – Rodrigo Diocesano e Renata Morielo – decidissem ir além das atividades físicas propriamente ditas e agregassem informações que pudessem ampliar o horizonte das crianças.
Meio ambiente
Foi assim que Arthur desenvolveu o seu método. Ele inicia as aulas frequentemente com vídeos, partindo depois para a parte prática. A aula sobre saltos, por exemplo, começou com a exibição de um vídeo que tratava do meio ambiente. Os alunos do 1º ano, com cerca de 6 anos, assistiram ao biólogo Mario Moscatelli mostrando a degradação da Baía de Guanabara. Em seguida, Arthur os levou para observar o riacho que passa atrás do Ciep e explicou que, como todos os outros da região, ele também deságua na Baía de Guanabara. Observaram, então, um mapa e localizaram nele o bairro de Bangu, onde moram e estudam, e a Baía, sobre a qual estavam aprendendo.
A parte prática consistiu em “construir” um “rio” fictício com cordas azuis, cujas margens foram demarcadas por cordas vermelhas. As crianças deviam saltar sobre o “rio”. O professor disse a elas que se o “rio” estava limpo era porque a comunidade do entorno separava o lixo e a companhia de limpeza urbana o levava. Mas se, em vez desse hábito, descartassem o lixo na rua, a chuva levaria o entulho para o curso d’água, poluindo-o.
Para demonstrar, pegou mochila, cadeira, papelão e colocou no cenário, pedindo que as crianças saltassem sobre ele novamente. Com o “lixo”, os saltos ficaram mais difíceis. Do mesmo modo, falou o professor, também acontece na vida da gente: se poluímos nossos rios, não podemos mais nadar neles sem o risco de contrair doenças, e toda a poluição vai parar no oceano.
Arthur explica que utilizar conceitos de outras disciplinas está de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, que preconizam o uso de temas transversais, como meio ambiente, saúde, trabalho e ética, entre outros, nas diferentes disciplinas. O objetivo é que o conteúdo apresentado dialogue com a realidade na qual os estudantes estão inseridos.
Jogos Olímpicos e inclusão
Os Jogos Olímpicos são tema de várias aulas. Uma delas teve como mote Terezinha Guilhermina, corredora brasileira multimedalhista paralímpica, que é cega. Após conhecer a história de Terezinha, por meio de um documentário, e saber que as Paralimpíadas reconhecem o valor das pessoas com deficiência, destinando às competições as mesmas instalações dos Jogos Olímpicos, os estudantes experimentaram correr com venda nos olhos. Contaram com o apoio de um atleta-guia, ou seja, um colega sem venda que corre ao lado, simulando uma disputa paralímpica.
Outros assuntos abordados foram o racismo no futebol (caso do goleiro Aranha, xingado durante jogo no Rio Grande do Sul); o espaço da mulher em jogos tradicionalmente associados ao universo masculino (vídeo com gols de Marta, que possui marcas iguais ou melhores que Neymar e Messi); e a questão de gênero (bailarinos e ginastas rítmicos – atletas que muitas vezes enfrentam preconceitos machistas).
Arthur conta que o vídeo introdutório ao tema facilita o aprendizado, porque a informação visual mostra concretamente o objeto a ser tratado, fazendo com que um aspecto até então estranho seja conhecido.
Matemática
Até a Matemática tem lugar nas aulas de Educação Física de Arthur Pires. Ele criou o “Minibasquete Matemático” – sucesso entre a garotada. Nesse jogo, há uma pontuação limite igual a 20. O professor reciclou a lixeira e a adaptou, colocando uma tela mosquiteiro como cesta e fazendo, dessa forma, com que ficasse em uma altura acessível às crianças pequenas. A distância entre o jogador e a cesta é ocupada por quadrados com a pontuação que se irá alcançar, caso se arremesse dali. Quanto mais longe da cesta, mais pontos se marcam. Dessa maneira, lances do quadrado mais distante – que vale cinco pontos – garantem a vitória em apenas quatro arremessos exitosos. Já do quadrado mais próximo à cesta, é preciso acertar 20 lances para chegar ao total necessário à vitória, pois nessa posição a cesta vale apenas um ponto. As crianças são divididas em equipes e cabe aos times decidir a melhor estratégia a seguir: de onde lançar a bola, de acordo com as variáveis com as quais contam – como ter ou não no time craques que sejam hábeis o suficiente para acertar a cesta dos quadrados mais afastados.
Aos 29 anos, prestes a ser pai pela segunda vez, Arthur Pires está contente com a escolha profissional. Tanto que, em fevereiro de 2016, passou no concurso para se tornar professor 40 horas na Rede Municipal do Rio de Janeiro. Vai fazer a formação em junho e espera ser chamado em breve. Mesmo nas horas vagas, ele se dedica ao esporte, mais precisamente à corrida, a ponto de ter completado os 42 quilômetros da Maratona do Rio em maio (do Posto 10, no Recreio, ao Aterro do Flamengo). “A maratona possui um apelo simbólico muito grande, já que é a modalidade fundadora dos Jogos Olímpicos.”